terça-feira, 9 de novembro de 2010

A nossa relação com a avaliação

Terça feira, 09 de novembro de 2010.

A nossa relação com a avaliação (1).

Dois recentes acontecimentos motivam a abordagem sobre o tema avaliação. O primeiro foi à reação do governo brasileiro sobre o resultado do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), desenvolvido em 1990 por Mahbub ul Haq (economista paquistanês), e que vem sendo utilizado, desde 1993, pela ONU, através do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), como uma medida de comparação entre países sob a ótica da educação (anos médios de escolaridade), alfabetização, expectativa de vida, natalidade, renda nacional bruta, etc.
O Brasil, segundo o relatório da ONU (04 de novembro de 2010), está na 73ª posição de uma lista de 169 países. Em relação a 2009, o Brasil subiu quatro posições.
As autoridades brasileiras não gostaram e, como reação, questionaram a nova metodologia, pois, com certeza, esperavam que o Brasil galgasse mais posições.
O segundo acontecimento refere-se a aplicação,das provas do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), nos dias 06 e 07 de novembro próximo passado.
Realizado pelo Ministério da Educação através do INEP (Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais do Ministério da Educação), pela segunda vez apresentou, infelizmente, problemas logísticos na sua aplicação.
Esses dois acontecimentos merecem serem observados segundo a reação dos envolvidos: os avaliadores e os avaliados.
Assim, inicio a abordagem, primeiramente, sobre a nossa relação e relação com o termo avaliação.

Relação e reação.

É muito forte a nossa relação com a palavra avaliação. Por vezes, dependendo de quem a manifesta (professores, chefes, organizações, etc.), nossa reação não tem nada de salutar. Fomos induzidos, desde dos primeiros anos escolares, a ter uma relação de temor com a palavra avaliação.
Passam-se os anos e dizem que ficamos maduros e “meio sábios”, mas continuamos tendo uma relação difícil com o termo avaliação. Não importa qual seja: avaliação do rendimento escolar (em qualquer nível de ensino), avaliação de desempenho, avaliação institucional, avaliação gerencial, avaliação por competência, etc.
Basta o termo avaliação aparecer que a conversa adquire tons irregulares (a voz sobe ou abaixa), tonalidades faciais (vermelho, amarelo, pálido, etc.) ou mesmo expressões faciais de preocupação, ceticismo, imaginação, etc.
É lógico que esses fenômenos humanos dependem da posição, isto é, de quem faz e comunica o resultado ou de quem foi avaliado e recebe o resultado.
Ser o avaliador é bem diferente de ser avaliado, ainda mais quando o resultado da avaliação é, no mínimo, desconfortável. Mesmo assim, o responsável em informar o resultado da avaliação, deve se orientar pela ética, inteligência e humildade.
Nossa reação ao resultado da avaliação “desconfortável”, geralmente traduz-se em questionamos a forma, o processo, os fatores considerados, as relações e comparações estabelecidas.
Ainda não conseguimos compreender e aceitar o resultado da avaliação como um desafio, isto é, uma meta a ser atingida e que necessita de um plano, de vontade de agir, da persistência em seguir o plano e, novamente, da avaliação do desenvolvimento do plano.
É preciso compreender que o objetivo da avaliação é o de mensurar o progresso das pessoas, instituições, empresas e governos e não o de buscar falhas, insucesso ou qualquer outro fator que tenha a intenção de punir.
A avaliação pode (e deve) nos “dizer” muitas coisas. A primeira é a de nos informar onde estamos em relação ao desejável.
Isso significa que a avaliação exige, como premissa, auto-avaliação, como forma de estimular pessoas, instituições, empresas e governos, a mensurarem o seu próprio progresso. A prática da auto-avaliação e avaliação, além de diminuir a resistência ao processo, pode resultar em aprendizagem e crescimento mútuo reduzindo, assim, o stress da reação.
No entanto, já como pauta da próxima abordagem, vale o lembrete: para planejar o futuro é preciso ser honesto com o presente.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A escola pública do Brasil

1. O paradoxo

É reconfortante a reportagem do Jornal do dia 24 de outubro, da Gazeta do Povo (Curitiba/Paraná) sobre as famílias que fazem opção em matricular seus filhos no ensino público, relatando depoimentos de pais que optaram pelas escolas da rede municipal de Curitiba. Com certeza, o mesmo fenômeno repete-se em inúmeras cidades brasileiras.
Apesar da reportagem referir-se ao ensino fundamental, principalmente da primeira a quinta séries, o “suspiro de conforto”, tem sua razão: desde os anos 70, quando iniciei minhas atividades de professor em escola pública, observo que a escola pública tem sido tratada com ceticismo e, em certos momentos, com desdém.
De época em época, a escola pública foi sendo responsabilizada e até culpada pelas passadas lentas do desenvolvimento econômico e social do Brasil. No cesto das culpas, os educadores e, em específico, os professores, foram sendo apontados como cúmplices desse processo.
Poucos se lembravam, na época, (diferentemente do que ocorre nos últimos dez, doze anos) em observar a gestão e os gestores dos sistemas educacionais: federal, estadual e municipal.
Por outro lado, a insistente comparação quanto à qualidade de ensino, professores comprometidos, material pedagógico, etc., entre escola pública e privada, causava-nos dissabores (aquele gosto meio amargo na boca) e desconforto.
Muitas coisas mudaram desde 1970. São quarenta anos de transformações sociais, tecnológicas, políticas, econômicas e ambientais. Até podemos concordar, que na média, as escolas públicas continuam as mesmas, com basicamente os mesmos currículos, mesmos ambientes de trabalho e o farto uso de “cuspe” e giz, como muitos gostam de dizer.
É paradoxal, especialmente pelo momento que vivenciamos no Brasil, dizer que é preciso fazer uma revolução na educação, ou que é preciso valorizar os professores, atrair a comunidade, melhorar os processos de gestão da escola e do sistema, enquanto mantém-se a critica a escola pública.
Em 2008, segundo o INEP/MEC, mais de 32 milhões de crianças e adolescentes (de 07 a 14 anos) estavam matriculadas no Ensino Fundamental. Destas, aproximadamente 87% (aproximadamente 27,8 milhões) estavam matriculados em escolas públicas (estaduais e municipais) e, 13% (aproximadamente de 4,1 milhões) em escolas particulares.
Então, é preciso, antes de tudo, reconhecer que a escola pública teve sucessos, só pelo simples fato de ter recebido e acolhido milhões e milhões de crianças e adolescentes. Mantê-los interessados e motivados pelo ambiente escolar, pelo que aprendem, pelas relações que constroem com seus colegas, professores e pais e, pelas oportunidades que a educação lhes proporcionará em uma país democrático é, entre outros fatores, um respeitável desafio para a sociedade brasileira, cujo núcleo de acontecimentos é a escola, principalmente, a escola pública.

2. A procura pela escola pública de qualidade.

Quero contar aqui um fato que muito contribuiu para que eu passasse a observar a escola pública com outro olhar: o olhar do sucesso.
Em 1992, como em anos anteriores, os pais faziam fila para matricular seus filhos em algumas escolas públicas, municipais e estaduais do Paraná. Alguns pais ficavam dois ou três dias acampados na frente da escola, para garantir uma vaga para seus filhos.
Nessa época, eu era Chefe da Assessoria Técnica da Secretária Estadual de Educação do Paraná sendo, o saudoso professor Elias Abrahão (faleceu em setembro de 1996) o Secretário Estadual de Educação.
Era o mês de fevereiro e um grupo de pais foram “bater panela” na frente da Secretaria de Educação, por não terem conseguido vaga para seus filhos nas escolas municipais e estaduais, em Curitiba, que ofertavam ensino fundamental e/ou ensino médio.
Na oportunidade, um jornalista de uma das redes de TV do Estado do Paraná perguntou ao professor Elias, antes dele receber os representantes dos pais: “Secretário, o que o senhor tem a dizer sobre as filas de pais na frente das escolas em busca de uma vaga para seus filhos?”.
O professor Elias sorriu e disse: “Isso é ótimo, significa que os pais querem matricular seus filhos nas escolas públicas porque elas oferecem um ensino de qualidade. Onde você vê filas, meu jovem, eu vejo uma boa escola pública”. E, completou: “Cabe-nos receber e matricular todos aqueles que procuram a escola pública”.
O professor Elias recebeu os representantes dos pais, que já haviam procurado a Câmara Municipal e definiu uma agenda de trabalho que permitiu, com a participação efetiva da Secretaria Municipal de Educação de Curitiba, matricular todos os alunos que haviam procurado matricular-se (o que incluía os filhos daqueles que foram “bater panela”). A demanda era de aproximadamente 500 matrículas, frente a uma oferta de mais de 4 mil vagas. Sim, sobraram mais de 3.500 vagas.
A questão se resumia no seguinte: os pais queriam matricular seus filhos em determinadas escolas (no geral renomadas), mesmo que essas escolas fossem distantes de suas residências.
O trabalho desenvolvido, naquele ano, por um Grupo de Trabalho com representantes das duas secretarias (estadual e municipal), revelou que existiam muitas escolas públicas merecedoras de aplausos e outras necessitando de mais presença e atenção dos gestores do sistema. Um dia ainda conto o promissor resultado desse trabalho.




3. Pacificar a escola pública.

É preciso pacificar a escola pública. Conquistá-la e seduzí-la, juntamente com a comunidade na qual se insere, a construir e concretizar um caminho para a educação brasileira. Existem políticas públicas para a educação brasileira. Elas estão definidas, com diretrizes e metas, no Plano Nacional de Educação (PNE), que valerá entre 2011 e 2020.
Operacionalizar o PNE, em suas diversas fases, facetas e níveis governamentais (federal, estadual e municipal) é o desafio maior.
O sucesso do PNE reside:
• Na capacidade de coordenação e gestão dos sistemas;
• Na capacidade de articulação com a sociedade organizada;
• Na capacidade de estabelecer com a comunidade onde as instituições de ensino estão localizadas, uma parceria responsável;
• Na sedução e atração das pessoas que trabalham nas instituições escolares públicas: dirigentes, especialistas, professores e demais funcionários;
• N construção, conjunta, de um projeto de respeito e valorização (pessoal e profissional) dos profissionais da educação; e,
• Na capacidade de envolver as instituições de ensino superior nesse processo, pela responsabilidade que têm na formação e qualificação de profissionais, não só da educação.
Pacificar, em especial as escolas públicas de ensino básico, exige disposição de se trabalhar frente aos sacrifícios e desafios decorrentes dessa tarefa.
Pacificar exige que o nosso olhar abrace o horizonte de possibilidades para o Brasil e re-conquiste a escola pública, para que ela reconheça e assuma o seu papel institucional nessa caminhada.
Pacificar compreende prover uma educação que possa preparar as crianças e jovens a exercerem a sua cidadania em uma nação livre e democrática: o Brasil.
Pacificar a escola pública significa re-conquistar a comunidade na qual está inserida e, num trabalho conjunto pela paz, eliminar o roubo, a depredação dos prédios escolares e a agressão aos professores e entre os próprios alunos.
Pacificar a escola pública significa iniciar a caminhada em direção a escola do futuro que, nas palavras do sociólogo francês Edgar Morin, “deverá se o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana. [...] Conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e não separá-lo dele.”.
Depreendidos e comprometidos, precisamos nos fazer úteis nesse desafio.
Então, mãos à obra!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A educação como estratégia

No Brasil a educação é tema recorrente em período de campanha eleitoral, assim como a saúde, segurança, habitação, meio-ambiente, infra-estrutura, etc.
O tema educação sempre ornamentou os discursos dos candidatos e dos governantes nesses períodos, ganhando forma e cor, ao longo da história, isto é, o discurso foi “evoluindo”, da necessidade da educação, para prioridade, depois prioridade “um”, e, prioridade das prioridades, etc.

A Educação não pode ser tratada somente como prioridade, ela deve ser compreendida como uma estratégia de governo, pois, é por meio da educação que as pessoas vão adquirindo conteúdo de cidadania, respeito à Constituição, qualificação, trabalho, e a somatória destes e outros fatores, resulta em desenvolvimento, geração da riqueza, respeito interno e externo, etc.

Como se vê, a equação compõe-se de inúmeras variáveis, mas, todas possíveis de serem planejadas e realizadas, com resultados positivos e previsíveis, que se configuram como responsabilidade da sociedade brasileira, cabendo ao governo (federal, estadual e municipal) a gestão, a articulação e a avaliação.

Os atores desse processo precisam responder diariamente a uma simples pergunta: que país pretendemos transferir para a geração que vai nos suceder?

A Revista Exame (Edição 978 – 20/10/2010), publica o artigo da jornalista Roberta Paduan (4 idéias para tirar o atraso na educação) que, segundo a jornalista, “... são medidas que devem ser colocadas em prática se quisermos alcançar um nível de educação compatível com um país que deseja chegar ao desenvolvimento”.
As quatro medidas são:
1. Acabar com a bagunça curricular;
2. Diagnosticar, planejar e medir;
3. Pagar mais aos professores;
4. Transformar o diretor em Gestor Escolar.

Enxuto e com conteúdo (vale a leitura e a reflexão), o texto fundamenta-se em estudos e pesquisas nacionais e estrangeiras e, também, em consideráveis exemplos de práticas governamentais de estados e municípios brasileiros.
Falar sobre a educação no Brasil, principalmente após os anos 90 tornou-se menos penoso e mais fundamentado. Menos penoso, porque a patrulha ideológica perdeu forças (ainda existem alguns remanescentes em fogo brando) e, mais fundamentado, porque dispomos de dados e fatos.
Assim, pretendo, na seqüência, com a contribuição de quem estiver interessado, explorar, devidamente essas quatro (e outras) idéias que não são novas, mas, destacam-se pela forma com que foram organizadas e apresentadas. Normalmente, esses temas são explorados individualmente com pálidas conexões.
O texto da jornalista Roberta Paduan inclui uma importante pesquisa sobre “Quanto Vale a Educação”, realizada pelo americano Eric Hanushek, doutor em economia pela MIT e professor da Universidade de Stanford/USA. É bom observar a sua conclusão (extrato) e refletir sobre “... como o Brasil pode aumentar a geração de riqueza caso consiga fazer uma reforma educacional nos próximos 20 anos...”.
Existe uma máxima que diz “Se você não sabe para onde vai, nunca chegará lá”.

domingo, 17 de outubro de 2010

Dia do Professor

A vida me permite expor algumas idéias e concepções sobre temas que me interessam ou que me envolvem diretamente, como é o caso em ser professor.
         Sou professor e ser professor, assim como outra profissão, é uma opção de vida. É uma decisão individual.
         Hoje, 15 de outubro é o dia do professor. Mas, todos os dias é dia do professor, assim como todos os dias é dia da criança, dia das mães e dia dos pais.
         Posso lamentar pela especificidade do dia não influenciar as pessoas em presentear-me, assim como fazem em outras datas. No entanto, há de se considerar o meu lamento pela forma com que a sociedade discursa sobre o papel estratégico do professor na educação das crianças e jovens e pela forma que ela age e reage. São, infelizmente, eventos que revelam a incoerência entre o pensar, falar e fazer.
         Perdoem-me aqueles que buscam, por buscar, reconhecimento da sociedade e do governo quanto à “valorização do professor”, traduzidos em atos materiais. O reconhecimento material concorde-se ou não, é decorrência da atitude espiritual e pessoal do professor.
         Não sou sacerdote, sou uma pessoa que assumiu a consciente atribuição e a responsabilidade de trabalhar na e pela educação das pessoas, com a missão individual e coletiva, de prepará-las, complementarmente à família, a exercerem a sua cidadania em uma nação democrática, o Brasil.
         Minha responsabilidade é com o futuro dessas gerações e, o futuro, esse desconhecido, às vezes parece-me promissor, quando a esperança predomina, às vezes parece-me preocupante, cinzento, quando o ceticismo predomina.
         Os dois cenários, o promissor e o preocupante constroem-se no traçado da nossa história de vida e recebem a marca das nossas concepções sobre o mundo e sobre como vemos as coisas, como as filtramos e com quais lentes as vemos.
         É difícil para mim pessoa-professor ficar neutro frente à realidade, ainda mais quando ela nos mostra a superação humana, como é o exemplo recente sobre os 33 mineiros no Chile ou quando nos revela as faces do analfabetismo, da fome e da miséria, que a minha geração não conseguiu eliminar.
         O sociólogo francês Edgar Morin, em seu inspirado e magnífico texto sobre os Sete Saberes da Educação do Futuro, traz-nos uma rica e densa contribuição para a pessoa-professor, revelando o que é a pessoa, o sujeito professor e o que poderá ser, se quiser “ser”.
         É impossível ficar neutro, após a leitura e reflexão da abordagem que Morin faz sobre o conhecimento, o ensinar, o planeta Terra, o ser cósmico, o espírito humano, etc.
         Esses temas, de suma importância para a nossa prática de pessoa-professor, não elimina ou ofusca a necessidade de termos uma atitude positiva e propositiva quanto à valorização funcional e salarial do professor, na mesma medida que nós não podemos ficar indiferentes ao comportamento desabonador de “colegas” professores, que observamos em nosso ambiente de trabalho: a escola.
         A qualidade da educação, tão cantada e falada, é uma atitude da mente e do coração. Existem milhares de exemplos nesse sentido, de escolas, professores ou mesmo de pessoas que se envolvem em ações educacionais, em ambientes que nos surpreendem pela simplicidade, dificuldade de acesso, localidade, perfil da comunidade, etc.
         Por que deram certo? Porquê, além da atitude da mente e do coração, o Amor e a Bondade pelo próximo, superam obstáculos, incompreensões, ceticismo e desesperança.
         Se considerarmos a educação como estratégia de crescimento, evolução e desenvolvimento contínuo da sociedade democrática e livre e, ao mesmo tempo, se construirmos um cenário possível e promissor, identificando o professor nesse cenário, estaremos vislumbrando como todas essas partes podem se encaixar e serem solidárias nesse processo e, também, como podem e devem ser fortes e coesas frente à irracionalidade humana, a tirania, ao analfabetismo, a fome e a miséria.